A novela da eleição para prefeito de Água Preta em 2012 tem dois capítulos: no primeiro, o candidato Armando Souto disputa o pleito sub judice, ganha, mas o registro de sua candidatura foi indeferido pelo TSE e os votos recebidos por ele foram anulados. O segundo colocado, Eduardo Coutinho, foi empossado como prefeito. Capítulo encerrado.
No segundo capítulo, Souto entra com recurso pleiteando nova eleição, já que obteve mais da metade dos votos válidos e, em princípio, pela legislação em vigor, quando isso acontece, outro pleito é convocado. O TRE, contudo, em julgamento no dia 16 do corrente, por quatro votos a dois, decidiu por não realizar nova eleição em Água Preta. Capítulo em andamento: cabe recurso ao TSE.
Desvendando os dados
Na publicação dos resultados da eleição de 2012 para prefeito de Água Preta o TRE mostra somente a votação obtida por Eduardo Coutinho (7.776 votos) e por Tibério de Dito (74 votos). Mas na página “Resultados dos candidatos com votação anulada”, sabe-se que Armando Souto teve 8.764 votos.
Ainda no site do TRE descobre-se que o total de votos nulos da eleição foi de 9.559. Subtraindo-se daí os votos anulados de Armando Souto, depreende-se que foram computados 795 votos nulos originais, aqueles decorrentes de manifestação de vontade eleitoral, de erro involuntário ou deliberado.
Como os votos em branco somaram 285 e os votos apurados totalizaram 17.694, segue-se que foram 16.614 os votos válidos originais. Dividindo-se a votação de Armando pelos votos válidos originais tem-se 52,75%.
Fundamento legal
Nestas circunstâncias, a legislação determina nova eleição, pois mais da metade dos votos válidos foi conferida a candidato cuja votação foi anulada pelo TSE. O art. 224 do Código Eleitoral expressa essa determinação, in verbis:
“Se a nulidade atingir mais de metade dos votos... julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias”.
A recente Resolução nº 23.372 do TSE, de 14/12/2011, que dá os contornos reguladores da eleição de 2012, enfatiza o que dispõe o art. 224 do Código Eleitoral, quando, no seu art. 164, item III, situa precisamente o ocorrido no pleito de Água Preta, verbatim:
“Se a nulidade dos votos dados a candidatos com registro indeferido for superior a 50% da votação válida e se já houver decisão do Tribunal Superior Eleitoral indeferitória do pedido de registro, deverão ser realizadas novas eleições imediatamente...”
Votos apurados = votos válidos
Segundo nota do TRE, do dia 16/01, divulgada logo após o julgamento do Pleno, a maioria dos desembargadores eleitorais do órgão “...ratificou o entendimento do Ministério Público Eleitoral, ao considerar como válida a totalidade de votos, incluindo brancos e nulos.”
Isso significa dizer que a Corte considerou os votos apurados iguais aos votos válidos. Em outras palavras, os votos originais em branco (285) e os votos originais nulos (795) foram descartados.
Com essa deliberação, os votos válidos do pleito aumentam para 17.694. Agora, a votação de Armando Souto dividida por esses votos válidos ampliados representa apenas 49,53%, isto é, menos da metade do total. Portanto, não se preenche o requisito ditado pelo art. 224, retro mencionado, para a ocorrência de nova eleição.
Votos em branco e votos nulos
Estas duas modalidades de voto (branco e nulo), contudo, são manifestações de vontade eleitoral e independentes dos votos anuláveis! São votos decorrentes de protesto, erro de digitação, indiferença, desinteresse, indefinição, etc.
Igualar os votos válidos aos votos apurados é desconsiderar tais manifestações próprias de ato exclusivo do eleitor. É como se na eleição nenhum eleitor tivesse tido o direito de se posicionar diferentemente daqueles que sufragaram voto em uma das candidaturas postas.
Ou, sob outro prisma, é como todos os eleitores que compareceram ao pleito fossem obrigados a votar nos postulantes ao cargo, não lhes sendo facultado o exercício de sua soberania decisória.
Note-se, ademais, que a votação de Armando Souto, considerada nula, não necessita dos votos originariamente nulos para atingir mais da metade dos votos válidos e, portanto, suscitar nova eleição. Quer dizer não viola o disposto na Resolução TSE nº 22.992/2008, verbatim:
“Os votos dados a candidatos cujos registros encontravam-se sub judice, tendo sido confirmados como nulos, não se somam, para fins de novas eleições (art. 224, CE), aos votos nulos decorrentes de manifestação apolítica do eleitor”.
Se os votos originariamente nulos se somassem aos votos anulados de Armando Souto o percentual total de votos anulados do pleito seria maior ainda, claro, atingindo 57,54% dos votos válidos.
Mas o próprio TSE (Agravo Regimental nº 665, Acórdão relatado pelo ministro Arnaldo Versiani*) se posiciona objetivamente sobre quais votos devam ser levados em conta para efeito de nova eleição, in verbis:
“Para fins do art. 224 do Código Eleitoral, a validade da votação ou o número de votos válidos na eleição majoritária não é aferida sobre o total de votos apurados, mas leva em consideração tão somente o percentual de votos dados aos candidatos desse pleito, excluindo-se, portanto, os votos nulos e os brancos, por expressa disposição do art. 77, § 2º, da Constituição Federal” (Grifo nosso, MCR).
Então, resta meridianamente claro que para o ensejo de nova eleição (art. 224) o número de votos válidos é o somatório da votação dos candidatos (8.764 + 7.776 + 74 = 16.614, no caso de Água Preta), excluídos os votos nulos e os brancos.
Em outro trecho desse mesmo Acórdão, é enfatizado que a validade da votação deve levar em conta apenas os votos consignados aos candidatos, ipsis litteris:
“Não se somam aos votos nulos derivados da manifestação apolítica dos eleitores aqueles nulos em decorrência do indeferimento do registro de candidatos; afigura-se recomendável que a validade da votação seja aferida tendo em conta apenas os votos atribuídos efetivamente a candidatos e não sobre o total de votos apurados” (Grifo nosso, MCR).
Então, visto assim de longe, sem acesso aos pareceres e votos de suas excelências, pode-se antecipar, data maxima venia, que a decisão do TRE
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